COMPANHIA DE REIS IRMANDADE DO NOVO HORIZONTE – 2013/14
20 de julho de 2022FOLIA DE REIS
Dona Luisa me convidou para filmar e fotografar a folia de reis da qual ela faz parte como bandeireira, a Companhia de Reis Irmandade do Novo Horizonte. Os integrantes são em sua maioria mineiros ou descendentes de mineiros e todos deles participam de folias de reis desde pequenos. Tendo migrado de Minas Gerais, conservam a tradição que para eles é sinônimo de Natal.
O tempo estava muito abafado e com cara de chuva, por isso resolvi ligar para Luisa, a fim saber como ficava em caso da água despencar do céu. Eles sairiam mesmo assim?
__”Nóis sái do mesmo jeito, Chico! Faça chuva ou faça sol, a gente tá lá pra cantá pra Santo Reis”.
Vesti uma calça comprida em respeito à devoção deles e lá fui para a rua, quatro horas da tarde, com aquele solão martelando na cabeça… O grupo já estava cantando desde a uma da tarde e quando os encontrei ninguém aparentava cansaço. O palhaço, ou marungo ia gritando em frente aos portões:
__ “Ei, patroa, Santo Reis demorô mas chegô, patroa. Vai querê recebê a bandeira de Santo Reis, patroa?”
De dentro da casa uma voz de criança manda esperar que a mãe já vai abrir para a folia entrar. O mestre dá o sinal e a sanfona, tocada pelo garoto de 14 anos, arrasta consigo os instrumentos e as vozes pedindo que a dona da casa aceite a bandeira. Ela aceita e os foliões em cortejo adentram a casa, postando-se em frente ao presépio. As crianças só tem olhos para os palhaços e os olhos da dona da casa se enchem de lágrimas porque folia de reis traz as lembranças de sua infância em Minas Gerais…
A próxima parada é um bar e a dona, que veste um tomara que caia, é chamada para receber a bandeira.
__”Não posso não, tô me sentindo muito nua assim, pede ali para minha irmã segurar, fazême o favor”.
A irmã toda contente empunha a bandeira e ensaia uns passos de dança com os palhaços, visivelmente ligada nos clicks do fotógrafo. A folia fica pouco tempo no bar, o ambiente não é hostil mas também não é acolhedor. Os bebuns olham os foliões como se fossem uma curiosidade saída dos livros de história do curso primário.
De morada em morada, chegamos à casa grande no fim da rua, onde será oferecido um jantar aos foliões, uma pausa antes de continuarem a peregrinação que deve durar até tarde da noite. A família toda já está reunida ao lado da porteira, para receber a bandeira. O momento é solene.
Recebida a bandeira, sentam-se todos às mesas e tomam guaraná e coca gelados. Um bufê é servido e insistem para que eu coma também. Tenho dificuldade de parar de fotografar, tamanha a riqueza que se revela aos meus olhos nestes encontros. Acabo fazendo meu prato com salada, arroz, feijão, farofa e um tiquinho de carne. Coca ou guaraná? Eu sempre fico na duvida de qual vai me fazer menos mal…
Passo às entrevistas, enquanto o pessoal faz a digestão e descansa um pouco. Quero fazer um video e preciso das falas das pessoas. Descobri que esta folia de reis tem dois mestres que se revezam no comando e que um dos palhaços passa o ano todo maquinando sua fantasia para sair no fim do ano. Ele mesmo idealiza, compra os adereços e quem confecciona é a vizinha costureira. Sua fantasia tem colares, muito brilho e até um chapéu de onde pendem caveiras de plástico, papais-noéis, sinos, bolas coloridas, espelhos e uma infinidade de outros badulaques.
As máscaras, que antes eram feitas de couro e pelos de animais, hoje já não assustam mais as crianças. Tudo é comprado em lojas de tecidos e artigos para natal e apesar da evidente criatividade, o material industrializado acaba sacrificando a magia.
Sou apresentado à dona da casa, que gentilmente concorda em ser entrevistada e o que é melhor, autoriza divulgação do material pelo YouTube. Dona Iolanda é mineira de nascimento e há 43 anos está em São José dos Campos. Se emociona ao falar da importância que tem a folia de reis em sua vida e na vida de sua família. Quando criança os irmãos saiam de palhaços nas folias e era ela quem fazia as máscaras com crina de cavalo, tela de mosquiteiro e tinta guache. A avó confeccionava as roupas de chitão, bem mais singelas que estas repletas de lantejoulas e penduricalhos como se vê hoje.
Dona Iolanda nunca deixa de convidar uma folia de reis nesta época do ano e servir uma boa refeição. Chegou até a “importar” folias de Minas Gerais quando não encontra uma local para visitar sua casa. Fiquei curioso, quis saber se as folias de Minas são como as daqui, se tem mulheres que participam, ou se mantiveram mais fiéis à tradição. Ao que dona Iolanda respondeu:
__Está tudo igual às daqui, Chico. O mundo está mudando em todo lugar. As mulheres estão ocupando os lugares que antes eram só dos homens, por que não nas folias também?